As poucas nuvens que pairavam no céu, misturando-se ao clima ameno da primavera tornavam a tarde perfeita para um passeio. Contudo, Noak não estava ali para aproveitar, pois a cada minuto que se passava, ele lembrava que sua família estava em outro continente e com a organização que ele trabalhava pelas redondezas. Ele confiava em Héctor, mas a frase dita por ele no dia em que se encontraram ainda martelava em sua cabeça e isso causava certo desconforto.


— Noak - disse repreendendo a si mesmo. — Você precisa manter o foco!

Ele foi até a biblioteca e pegou um livro sobre sobre metamorfose. Era algo simples que informava o passo a passo de uma lagarta que se transforma em borboleta, só que em um formato infantil. Para muitos, aquilo poderia ser apenas perda de tempo, mas para Bleecker, aquele livro era uma janela aberta para a seu aprendizado, ele só precisava se concentrar na habilidade da lagarta de ganhar asas.

Ele caminhou até os jardins da grande mansão governada por Blackmore e sentou-se com as pernas cruzadas sobre um tapete de grama coberto por margaridas, rosas e begônias. O aroma do lugar era incrível e fazia lembrar da mãe, mas por outro lado ele também sentia uma paz de espírito perfeita para que pudesse descobrir mais sobre a sua individualidade.

No caso da borboleta, a lagarta adquire energia através da alimentação. Ela passa um longo período comendo e depois transforma seu próprio corpo em um casulo. Em alguns dias, a borboleta rompe o casulo e se liberta com uma transformação que a deixa muito mais bela e desenvolta. Era exatamente isso o que o rapaz precisava.

Ele respirou fundo e buscou concentração. Não desejava se transformar em uma borboleta, mas queria sentir a sua mutação fluindo no corpo, como se ele estivesse controlando ela de acordo com a sua vontade, não só quando estava com alguma emoção à flor da pele.

Com os olhos fechados, ele imaginou suas células por todo o corpo, mas sabia que seria muito mais fácil se focasse em apenas uma parte, por isso resolveu usar a mão esquerda como cobaia no primeiro momento. Ele imaginou as milhares de células que formavam o membro e, com a mente livre de qualquer pensamento, ordenou que as mesmas entrassem em ação, mas que não modificasse a sua forma.

Diferente da lagarta que tirava a energia dos alimentos, Noak usou a sua própria para gerar impulso na organização celular da mão, fazendo com que elas vibrassem em sintonia com seus batimentos cardíacos. Inicialmente sentiu a ponta dos dedos formigarem, depois o formigamento tomou conta da palma e do dorso, cessando no pulso. Era uma sensação terrivelmente esquisita, mas aos poucos ele foi se acostumando.

Visando observar se o membro estava do mesmo jeito, ele abriu os olhos e ergueu a canhota na altura dos olhos. Conforma seu coração pulsava, era possível observar que as células tremiam e ameaçavam que fariam a pele mudar de cor, mas não acontecia devido as ordens que os pensamentos do moreno indicavam.

O intuito dele, naquele momento, não era mudar a sua forma, mas sim controlar as células metamórficas de seu corpo, assim teria mais chances de evitar se transformar em um peixinho dourado cada vez que se assustasse.

Bleecker deu uma pausa, bebericou um gole de água e voltou ao treinamento, agora evitando uma concentração tão grande quanto a anterior. Ele respirou fundo e controlou o tecido celular da pele, fazendo-o vibrar ao compasso da pulsação cardíaca como da primeira vez. Dessa vez as células agiram de forma mais rápida, quase não dando tempo do homem sentir o desconforto do formigamento, apenas causando um calor incomum no local.

Com um sorriso, o metamorfo resolveu ousar um pouco e cutucou a pele do dorso da mão com o indicador direito, percebendo que as células do local vibravam numa intensidade maior, como se quisessem acabar com aquilo que as incomodava.

Entusiasmado com o que acabara de fazer, Noak colocou-se de pé e ficou diante do sol aprazível da tarde. Respirou profundamente e, concentrando-se nas celulas de todo o seu corpo, ordenou que elas vibrassem na mesma intensidade da pulsação sanguínea.

Começando pela ponta dos dedos, o russo sentiu os formigamento iniciar, passando para os antebraços, cotovelos, bíceps, ombros, cabeça, peito, costas, abdômen, cintura, nádegas, virilha, coxas, joelhos, canelas, tornozelos e pés. Foi quase como um arrepio simultâneo que começa num lugar e termina em outro, mas só que contínuo. Esboçou um breve sorriso, mas assim que ouviu a voz de Larry ele se desfez, assim como sua concentração.

— Metamorfose? É um livro ótimo para as crianças - Falou o loiro com seu copo térmico recheado de café na mão direita. — Mas se está querendo algo voltado para a mutação genética de metamorfose, eu posso te ajudar.

— Eu precisava de qualquer coisa que me ajudasse com o meu controle e esse foi o mais próximo que encontrei. - Explicou assim que sentiu o rosto arder. — Você também é um metamorfo?

— Pode-se dizer que sim - disse ao transportar o peso de uma perna para a outra. — Acho que tenho algumas anotações na minha sala, mas tenho uma aula para instruir daqui cinco minutos, se quiser podemos conversar no jantar, assim eu posso entender melhor a sua mutação.

O loiro lhe sorriu.

— Mas você está indo bem com o controle das células, é o primeiro passo.

Larry parecia uma pessoa que Noak odiaria estar por perto, pois ele exalava bondade e felicidade para todo o canto, mas ele também era do tipo que ele usurparia para conseguir o que ele desejava, naquele caso, o controle sobre sua individualidade, por isso resolveu ser o típico puxa saco

— Obrigado, mas com a sua ajuda eu sei que posso aperfeiçoar. - Um sorriso falso brotou em seus lábios. — Adoraria aprender mais sobre metamorfose e acredito que você seja a pessoa perfeita para me auxiliar. A propósito, quer uma ajuda com os livros?

Larry negou com um sorriso, mas Noak pegou os exemplares que estavam em sua destra e os carregou até a sala do professor.

— Obrigado, mas realmente não precisava, estou acostumado.

— Que nada, eu já havia terminado o que estava fazendo e não custa ajudar, não é mesmo? - Mentiu descaradamente e, mas para a sua sorte o loiro não percebeu nada. — Agora eu preciso comer alguma coisa, minhas células precisam de um pouco de cafeína. - Ele despediu-se com um aperto de mão e deu de ombros.

Enquanto ele caminhava em direção à sala de jantar, local que estava servindo um lanche da tarde abarrotado de sanduíches, seus olhos cuidavam atentamente a geografia e o designer da mansão. Apesar de estar ali por uma razão, ele estava completamente maravilhado com a estrutura e com a inciativa de Yvora em criar aquele lugar para pessoas que especiais. Um exemplo de criatura, muito diferente do homem que o instruiu, mas quem era ele para julgar o velho Héctor?

Perícia Treinada:

Viver com as crianças do instituto até que não era uma coisa tão ruim, considerando, é claro, que Noak podia se trancar no quarto caso se enjoasse delas. Entretanto, não era o caso daquela manhã. Ele deixou seus aposentos antes do café e resolveu mudar a série de exercícios diários que fazia. Geralmente ele corria ao redor de uma das quadras de esportes, mas naquela manhã pedia algo especial, por isso dirigiu-se até a área de recreação, local composto por piscinas de várias profundidades.

Por já ter uma noção básica de nado, resolveu rumar em direção à olímpica que era dividida em dez raias e o seu comprimentos se alongava por cinquenta metros. Ele usava uma sunga listrada com três tons de verde diferentes, deixando a peça harmonizada com um toque de esperança. Noak odiou a sunga, mas foram os responsáveis da Genesis que tinham arrumado suas roupas para aquela missão, por isso ele fingiu demência e colocou na cabeça que a sunga era preta.

Bleecker se posicionou na raia três, seu número da sorte, colocou uma toca de borracha na cabeça e um óculos de natação, itens simples que encontrou na própria área de recreação.

Concentrado na água, o jovem colocou-se na posição inicial, como se fosse participar de uma competição e, contabilizando os três primeiros números, trancou a respiração e lançou-se na piscina em um movimento rápido.

O metamorfo mergulhou alguns metros abaixo da superfície e apontou para o outro lado. Enquanto expelia o ar tragado, ele retornou à superfície e jogou o braço direito para frente, fazendo uma concha com a palma. Ao tocar na água, ele empurrou o líquido para trás e, automaticamente, fez o mesmo movimento com o esquerdo.

Enquanto os braços repetiam os movimentos que exigiam uma pequena dose de força, as pernas do mutante, mais precisamente os pés, chutavam a água e empurravam-no para frente.

Enquanto as pernas e os braços trabalhavam em conjunto, Noak aproveitava o movimento de erguer o braço para respirar. Quando o direito estava fora d'água, era possível vê-lo colocar o rosto para este mesmo lado e sugar a maior quantidade que conseguia. Quando o outro braço estava para cima, ele simplesmente dispensava o ar que havia inspirado, repetindo esta ação a todo momento.

O moreno rapidamente chegou à outra borda, então deu uma cambalhota debaixo da água e, com o auxílio dos pés, se impulsionou para a direção de onde ele havia partido. Ficou submerso por alguns metros, mas assim que voltou à superfície tornou a bater os pés com velocidade e a puxar água para trás no intuito de se mover para a frente.  Em alguns segundos ele atingiu a outra borda.

Noak saiu da piscina e sentou-se no pequeno degrau que ficava próximo dela. Há meses ele não praticava natação e, apesar de correr todas as manhãs, os músculos trabalhados no nado não eram os mesmo que trabalhavam no cooper.

Enquanto respirava, o moreno passava em sua mente o itinerário de aulas que Yvora havia lhe passado para entenderr melhor a sua mutação. Sua idade era muito mais avançada que os demais alunos, mas o retardo em suas habilidades eram tão notórias quando os músculos avantajados que tinha. Seguindo a promessa que a fundadora havia feito, Noak poderia aprender mais sobre as suas habilidades até que se sentisse seguro para seguir seu caminho.

Ele checou a hora e decidiu que conseguiria aproveitar mais vinte minutos na água, depois precisaria de um banho e de um regrado café da manhã.

Rupp colocou-se de pé no degrau da raia três e preparou o corpo para um novo salto na água. Contou, novamente, até três e lançou-se na olímpica, agora ficando mais tempo submerso e nadando sob a superfície. Ao subir, colocou-se a nadar na estilo borboleta, onde consistia em bater os braços ao mesmo tempo e na mesma direção, usando os momentos que ambos estavam alvos para respirar. As pernas continuavam chutando a água, assim ganhando distância da primeira borda.

Quando chegou à outra extremidade da piscina, Noak deu a mesma cambalhota e emergiu com a barriga para cima e de costas na água. Por não estar em nenhuma competição e por já sentir o corpo um pouco esgotado, ele resolveu nadar de costas, mostrando maestria e cuidado.

O russo repetiu o movimento diversas vezes, até que sentiu o corpo cansado e seus músculos doloridos. Ele saiu da piscina, secou-se e depois enrolou o corpo em um roupão atoalhado. Usou um dos banheiro da própria área de recreação para banhar o corpo e se vestir com algo apropriado para o longo dia que teria pela frente.

Chegando à sala de jantar, encontrou uma mesa abarrotada de frutas, pães, biscoitos e diversas bebidas. Ele optou por um suco de laranja, um pedaço de pão e uma pequena tigela com banana, mamão, kiwi e morangos cortados. Depois de encenar uma reza, só restava ele aproveitar àquela refeição.

Perícia treinada:

Deslizar as páginas daqueles livros não era nem um pouco agradável, mas como o próprio Larry havia lhe dito: Ler sobre a individualidade era o primeiro passo para o aperfeiçoamento. Noak não acreditou muito nisso, pois aquilo soava como baboseira e ele odiava baboseiras. No entanto, resolveu tirar algumas horas do seu dia corrido para treinar as suas habilidade metamórficas.

Na primeira vez, a que acabou por conhecer o professor que estava lhe ajudando, ele conseguiu manipular tranquilamente as células do corpo, assim desenvolveu um bom desempenho em compreendê-las. Entretanto, naquela linda tarde, Bleecker desejava se transformar e manter a transformação por algum tempo e depois voltar ao normal.

Depois de ter procurado um lugar vazio, algo muito difícil em meio ao instituto, o rapaz conseguiu se aconchegar próximo à ponte de pedra, mais próximo da floresta do que da própria mansão. Ele respirou fundo e sentiu o aroma das árvores e das flores que compunham o arvoredo e o jardim. Seus olhos estavam fechados enquanto ele mantinha a concentração nas células do corpo, algo que já tinha feito antes. Com a imagem de uma raposa em seus pensamentos, Noak se manteve quieto, apenas mantendo o contato da luz solar sobre a sua pele.

Trancando a respiração por alguns segundos, o metamorfo ordenou mentalmente que suas células mudassem de forma, deixando a raposa-vermelha em evidência na sua mente. Quando as células do corpo começaram a executar a função ordenada, Noak sentiu o corpo latejar e uma dor constante nos ossos, algo que a transformação, infelizmente, causava. Primeiro seu rosto foi ganhando pelos ruivos e um nariz pontudo; as orelhas foram ganhando uma forma canídea e os olhos também se modificaram, tornando o homem bonito em uma aberração bestial; por fim, mas não menos importante, foram as patas e a cauda.

Ele não tinha percebido o quanto o seu corpo ficara menor, mas se houvessem testemunhas, com certeza diriam que o corpo não era do homenzarrão que caminhava pelos corredores do Instituto Blackmore. Bleecker inclinou o corpo e deu um pequeno salto, aterrissando na relva em sua forma canídea, sustentando-se pelas quatro patas. A raposa era idêntica a que o mutante ostentava nos pensamentos,


Disse a si mesmo através dos pensamentos. Ele avançou um passo com uma das patas dianteiras e depois com a outra. As traseiras acompanhavam o movimentos, mas não era fácil, pois ele sentia que estava aprendendo a caminhar pela primeira vez, como se fosse uma criança.

Manter o equilíbrio nas quatro patas era tranquilo, o problema mesmo era conviver com uma continuação da coluna vertebral movimentando de um lado para o outro. Noak achou estranho ter uma cauda, mas precisava aprender a conviver com aquilo se quisesse usufruir da sua individualidade. Manter a transformação lhe exigia concentração, principalmente para executar movimentos, mas a concentração não era problema para ele.


Entendendo melhor o funcionamento do novo corpo, a raposa usou o focinho para cheirar algumas flores e começou a correr por um perímetro, aproveitando mais da sua mobilidade e flexibilidade. O canídeo até estava pensando em apostar uma corrida com a própria sombra, mas a voz familiar de Larry ecoou de cima da ponte e findou com o treinamento uma segunda vez.

— Será que essa raposinha quer um pouco de água? - Perguntou e saltou do alto da ponte, aterrissando na grama.

Noak, em sua forma animal, se aproximou do homem e o cutucou com o focinho. O professor abriu a garrafa que carregava consigo e despejou o líquido na própria palma enquanto ela formava uma concha. A raposa bebeu a água e, em seguida, pediu um carinho na cabeça.

Sentindo as células não suportarem mais a transformação, Noak se obrigou a voltar à forma humana, ficando de quatro e com a respiração ofegante enquanto lutava para não desabar. — Fala pra mim que as minhas roupas estão no corpo...

Larry fez uma careta e riu, fazendo o metamorfo olhar para o corpo depressa, encontrando as roupas em seus devidos lugares. — Bobo, eu pensei que estava pelado.

— Você sabe que eu não me importaria - Falou sorrindo.

— Mas eu sim, sabe bem como sou envergonhado. - Mentiu e depois sentou ao lado do loiro enquanto observava o sol que começava a se pôr no horizonte.

Sentados e aproveitando àquela vista, os rapazes beberam mais água e conversaram sobre como o dia deles havia sido até aquele momento.

Perícia Treinada:

Poder utilizado:

Adendo:

O sorriso estampado em meu rosto se fez presente da sala de aula, até o momento em que fechei a porta do quarto atrás de mim. Ele se desmanchou tão rápido quando a queda de uma cachoeira, muito diferente da dor de cabeça que ousava em me atarantar.

Apesar de já ter anoitecido, caminhei até a janela e fechei a cortina para inibir a luz prateada da lua. Desliguei as luzes do quarto e sentei na cama por dois, longos, minutos. Respirei fundo e tirei os sapatos, a gravata e desabotoei a camisa. Não havia nenhuma centelha luminosa no recinto, mas mesmo assim mantive os olhos fechados. A falta de luz foi amenizando a enxaqueca causada pela gritaria daquelas pestes, mas por fim estava tranquilo e...

Pouco antes de eu ficar feliz por estar sozinho no único lugar que me dava paz, um par de batidas atingiu a porta. Trinquei os dentes por alguns segundos, então levantei e fiz uma expressão amigável no rosto. Liguei a luz com relutância e abri a porta, revelando a presença de Larry do outro lado.

— Oi... Eu vou dar uma volta na ponte de pedras antes do jantar, quer ir comigo? - A voz do loiro era calma e entonava uma felicidade que me incomodava.

— Oi - disse com o sorriso simpático. — Eu adoraria, mas estou com uma enxaqueca horrenda. Podemos deixar para amanhã? - Eu não estava com tanta dor, mas precisava fazê-lo sentir uma ponta de pena, assim não insistiria para que eu o acompanhasse.

— Claro, podemos deixar pra amanhã sim - O sorriso frustrado dele me deu um prazer incomum, mas retribuí ele, assim transpassando que estava tão triste quanto ele. — Melhoras... Se precisar de mim, sabe onde me encontrar. -

— Obrigado! - Agradeci. — Bom passeio!

Assim que ele deu de ombros, fechei a porta e colei as costas nela. Passei o dedo no interruptor e sorri. tirei a peça desabotoada e caminhei em direção ao banheiro. Despi-me de tudo que cobria meu corpo e tomei um banho rápido.

Com o corpo seco e sem nenhuma tecido cobrindo o corpo, liguei a luz, coloquei-me em frente ao espelho e verifiquei o meu belo corpo escultural. A dor de cabeça já não era mais problema e isso me deixou com um sorriso que me tornava ainda mais lindo. De repente, um pensamento cortou o meu momento.

Desde que chegara ao instituto, eu nunca mais transformei meu corpo para outra forma humanoide, assim como não dissera para ninguém sobre essa habilidade. Larry, alguns professores e alunos só sabiam que eu me transformava em animais, mas era exatamente isso o que eu desejava, assim teria um trunfo na manga.

Fui até a porta e verifiquei se ela estava trancada, depois voltei para o espelho, verificando a imagem que ele refletia. O sorriso maléfico que ele me mostrava era lindo, algo que me fez sentir uma nostalgia. Saudades do tempo em que era apenas um rapaz russo, onde não precisava fingir nada.

Respirando fundo e manipulando as minhas próprias células, ordenei que elas transformassem metade do meu corpo na aparência do professor Larry. No início eu me assustei um pouco, mas fui me acostumando enquanto observava os traços diferentes que possuíamos. Apesar de ambos termos barba, ele era completamente liso no restante do corpo, sendo isento de pelos, enquanto eu os mantinha aparados.

Sorrindo, tampei o lado do rosto que mostrava minha aparência e comecei um diálogo com o espelho, imitando aquele que tiveram com Larry há alguns minutos: — Oi... Eu vou dar uma volta na ponte de pedras antes do jantar, quer ir comigo? - a voz era idêntica a do outro mutante, mas depois ele tampou o lado loiro (o do Larry) e respondeu. — Vai à merda, filho da mãe! Eu só estou te usando, some da minha frente! -

Não consegui controlar o riso, mas precisei manter o controle para continuar a brincadeira em frente ao espelho: — Mas Noak, eu quero casar com você e adotar três crianças pentelhas. - Disse ao deixar visível o lado que ostentava a aparência do professor irritante. — Casar? Não me faça rir. O máximo que eu quero contigo é uma boa transa e depois desaparecer. - Sorri ironicamente e deixei ambos os lados refletindo no espelho. — Você me irrita!

Nesse momento, um par de batidas atingiu a porta e eu precisei fazer meu corpo voltar ao normal, deixando minha aparência inteira. Coloquei a toalha na cintura e abri a porta, revelando Larry do outro lado. Querendo socá-lo, sorri cinicamente e usei toda a minha falsidade para conversar com ele.

— Larry, estava pensando em você agorinha, acredita?

— Era algo bom? - Perguntou o loiro.

— E eu consigo pensar algo ruim de um homem como você? - Dei uma piscadela, mas a vontade era de vomitar.

— Assim você me deixa acanhado, Noak...

— Mas não fique - falei sorrindo, mas logo mudei o assunto. — Aliás, o que acha de um passei na ponte de pedra depois do jantar?

— Mas e a dor de cabeça?

— Já passou, então quero aproveitar com alguém importante - consegui fazer meu rosto ficar corado com a ajuda da metamorfose, mas era apenas blefe. — Só preciso me trocar... Se quiser pode entrar e me esperar. -

Ele engoliu em seco e ficou vermelho de vergonha. — Tem alguns alunos pelo corredor, melhor não.

— Tudo bem, então. vou me arrumar rapidinho e descemos para a sala de jantar. Fingi uma expressão triste, fechei a porta e me arrumei.

Bem, naquela noite não aconteceu nada, embora sinta que meu ranço pelos alunos tenha aumentado.

Perícia treinada:

Poder utilizado:

Naquela manhã o dia parecia diferente. Apesar do outono estar ganhando seu espaço em solo americano, o clima era de inverno, tendo uma brisa fria correndo pela quadra de esportes, mas Noak parecia não se importar. Talvez o costume do Frio da Rússia ajudasse-o, ou o alongamento que ele executava não o permitia sentir frio. Talvez as duas opções, mas o fato é que ele estava ali antes do horário que qualquer aluno pudesse estar.

A luz diurna já clareava a área, possibilitando ao infiltrado uma visão perfeita de todas as raias da pista de corrida que serpenteavam ao redor da quadra de futebol. A vestimenta dele era tão confortável quanto o par de tênis que tinha nos pés, algo que aprendeu com o professor de educação física no colegial: Se quisesse correr, o primeiro passo seria um tênis específico para tal atividade.

Com o alongamento da pernas terminado, Bleecker alongou os braços e ombros. A regata deixava seus bíceps e tríceps visíveis, mas nenhum aluno estava por perto, então não tinha com o que se preocupar. Tornando a ficar de pé, Noak flexionou o corpo e tocou as pontas dos pés com os dedos, preparando o tronco para uma corrida.

Antes de se iniciar o treino, ele foi até o equipamento eletrônico que controlava as quadras e fez algumas modificações, assim ele não precisaria parar de correr para organizar. Ele manipulou os comandos e, assim que ele completasse uma volta, empecilhos iriam surgir da pista, assim dificultaria sua locomoção, pois a segunda volta teria obstáculos.

Arrumado na raia três, o moreno posicionou o corpo como se fosse entrar em uma competição de corrida. Ele corria diariamente, mas naquela manhã não iria treinar cooper, mas sim uma modalidade mais agressiva, usufruindo de alta velocidade.

Respirando fundo três vezes, o infiltrado começou a movimentar seu corpo. Seu intuito era atingir sua maior velocidade enquanto corria, mas levou alguns segundos para que seu corpo atingisse uma aceleração mais branda. Contudo, ele estava muito mais rápido do que o cooper matinal que executava.

Com passos largos e velozes, Noak atingiu um quarto da pista em segundos. Seus braços também se moviam, mas não com a mesma intensidade das pernas. Em mais alguns segundos ele já tinha corrido metade do percurso e atingindo o pico da sua velocidade, só restava mantê-la e foi exatamente isso o que ele fez até chegar ao seu ponto de partida.

Ele estava cansado, mas seu treinamento não era só correr, mas sim atingir seu limite e continuar, assim adequaria seu corpo à proposta que ele mentalizava.

Conforme ele manipulou no sistema da pista, assim que ele passou pelo ponto de partida, cavaletes foram surgindo, começando com um menor, onde Noak não teve problema algum em saltar. O segundo também não houve nada de mais, saltando por ele com facilidade. O terceiro apresentou uma dificuldade maior, mas o espaço entre ele e o segundo era maior, dando ao infiltrado uma distancia mais adequada para pegar impulso.

Os obstáculos só tomaram forma na metade da pista, por isso foram poucos. Contudo, o último obrigou o metamorfo a esticar ambas as pernas em seu ápice, só assim conseguiu saltá-lo e, mesmo assim, quase machucou seus países baixos.

Na outra metade do percurso, Rupp programou que uma espécie de cama de cordas, de cinquenta centímetros de altura e dez metros de comprimento, crescesse em dois lugares específicos, assim ele precisaria rastejar para chegar ao outro lado e foi o que ele fez.

Com os antebraços no chão e usando as coxas, o diretor se arrastou por baixo da primeira cama de cordas. Ele manteve a sua respiração controlada enquanto se arrastava por ela, nspirando pelo nariz e expirando pela boca, fazendo o diafragma trabalhar constantemente e corretamente.

Assim que passou pela primeira, ele já sentiu as pernas arriarem. O esforço que fez para atingir sua maior velocidade começou a mostrar as sequelas nos músculos, deixando-os formigando e com sintomas de desgastes, como se fosse parar de funcionar a qualquer momento. Ele não sentia dor, mas suas pernas estavam esgotadas.

A segunda cama de cordas parecia que nunca chegava, mas esse era outro efeito que seu treinamento lhe causava. Quando chegou, ele se abaixou e tornou a se arrastar, mas era possível notar que seu desempenho não era o mesmo, mas mesmo assim ele continuou trabalhando os braços e as pernas, avançando metro por metro.

Quando chegou ao fim, faltava muito pouco para chegar ao ponto de partida, por isso ele correu o mais rápido que conseguiu, sendo muito inferior ao modo como iniciou.

Chegando onde ansiou, Noak não aguentou o peso do próprio corpo e caiu sentado. Ele sorria enquanto o corpo expulsava suor de muitos poros. Tentava controlar a respiração, mas os pulmões não respeitavam suas ordens, apenas faziam o trabalho de sugar e expulsar ar com velocidade, ofego como nunca. Entretanto, mesmo com tamanho cansaço e esgotamento, ele estava contente por ter conseguido completar o trajeto que o próprio tinha preparado, mas já imaginava o próximo treinamento com uma volta a mais.

E ali, jogado na pista de corrida, ele se manteve. Feliz, confiante e com os pensamentos no próximo treinamento. Como os pesquisadores da GENESIS manipulavam suas cobaias a chegarem ao limite, ele jurou a si mesmo que faria o mesmo com seu corpo. Noak não iria se contentar com pouco, e sim com o melhor resultado.

Perícia treinada: