Tinha acordado cedo. Tipo, cedo mesmo. Quando peguei o celular o relógio digital da tela de bloqueio indicava que eram seis horas da manhã. Eu tinha o hábito de acordar cedo, mas não tão cedo assim, meu horário de costume em dias livres era entre sete horas e meia a oito horas, no mais tardar nove e meia da manhã.

Mas já que fui acordado tão cedo assim por alguma força exterior, então vamos fazer algo de útil e aproveitar o começo do dia!

Sentei-me na cama, espreguiçando enquanto ainda despertava os sentidos, mas de imediato percebi que a cama de Chesco estava vazia e arrumada. Meu colega de quarto tem o mesmo hábito que eu de acordar cedo, é verdade, mas não me recordava dele acordar tão cedo assim também.

—  Francesco?! — Chamei pelo rapaz, mas nenhuma resposta foi obtida. Minha voz ainda estava um pouco embargada pelo sono, mas tinha certeza de que havia sido mais do que suficiente para que ele escutasse do banheiro caso estivesse dentro do quarto ainda. Porém só por precaução bati na poder me certificar se ele estava ali dentro. Nenhuma resposta também, e até mesmo tentei sentir a presença dele no cômodo através de suas emoções, mas nada de novo. —  Será que aconteceu algo? — Questionei a mim mesmo, só esperava que nada grave ou sério demais tivesse acontecido com ele.

O Francesco começou a perder toda aquela pose que ele tem dentro do Instituto depois que passei a dormir sob o mesmo teto que ele.

Deixei minha preocupação fluir para outro sentimento. Ficar apreensivo não iria ajudar de nada naquele momento.

Tomei o meu banho e vesti roupas limpas, colocando as usadas bem dobradas no cesto que deixava debaixo da cama, mais tarde as lavaria. Tomei partido para o que mais me interessava no momento. Tinha um trabalho da matéria de Teoria e Prática da Cor para entregar semana que vem, e queria agilizar o trabalho para conseguir ficar livre o quanto antes, além de não correr o risco de acumular com novas atividades. Pan burra nasce hétero!

Acontece que terminei o trabalho antes mesmo do esperado. Minha atividade sobre cores complementares estava pronta, por isso que voltei para o conforto da cama e comecei a navegar pelo celular, só percebendo que era um pouco mais de dez horas da manhã naquele momento, mas de repente a porta foi aberta.

Até mesmo tinha retirado os fones de ouvido imaginando que fosse o italiano metido entrando, mas não era uma garota. Muito bonita por sinal, mas o nó na minha cabeça era o que ela estava fazendo ali. Contudo parte dele foi desfeito ao vê-la olhar para cama de Chesco e vociferar, além dos sentimentos dela.

O Francesco tem uma namorada?

Foi a primeira coisa que pensei, e talvez a explicação plausível para aquele cenário? Eu só não tinha entendido o pequeno incômodo que havia surgido em mim ao ter cogitado a hipótese de ela ser namorada dela. Chesco e eu nos damos bem, apesar do atrito que surgiu no primeiro dia que nos conhecemos.

—  Pode ficar a vontade, moça... — Disse um pouco desajeitado. em todos esses anos nesta indústria vital esta é a primeira vez que isso me acontece. Eu nunca tive que lhe dar com o romance de alguém. Até porque eu quase sempre estive em um dormitório separada aqui dentro. E o nome dela era tão bonito quanto ela mesma. —  Meu nome é Amélio... — Cocei a nunca ainda um pouco perdido, ela realmente parecia bem íntima do Francesco. Eu ficar ali poderia piorar as coisas talvez? Sem contar que deve ser um saco ter que presenciar uma briga de casal e ter que ficar sentindo toda a subjetividade dos dois enquanto eles brigam. —  Eu não sei para onde o Chesco foi, mas posso sair para dar privacidade para vocês dois se resolverem em paz. — Finalizei apontando para a porta do quarto.

Desirée apesar da sua feição encantadora, parecia ser igualmente imparável quando furiosa. Eu não quero estar presente nessa cena, pois Chesco possui um gênio igualmente difícil.

Fiquei um pouco perdido quando ela riu. Eu tinha falado alguma barbaridade ou algo assim? Não a tinha ofendido, tinha? Esperava que não, mas a negativa dela, acho que ofendi um pouquinho sim. Pera aí! Eu não verbalizei em nenhum momento a minha questão se ela era namorada ou não do Chesco... então ela conseguia ver além do externo das pessoas também?! Ótimo, será que era irmã do italiano? Acho que não, ela era mil vezes mais bonita que ele. Não que o Francesco fosse feio, longe disso... é só dar uma olhadinha direito para ele que você vai perceber de forma bem explícita.

No entanto eu vou dar um desconto para ela, afinal não seria muito justo cobrar ou reclamar algo dela considerado que eu conseguia sentir as emoções dela também. Só nesses últimos momentos ela foi de irritada para desapontada, frustrada, indignada, e acho que o mais recente foi o insultada com a minha pergunta. Foi só no meio dessa análise que também percebi o leve alívio que senti com a negativa dela.

Por que eu estava assim?

—  Se te consolar eu sei o que você sente... — Já que ela estava me contando, não há o porquê de não contar para ela também. —  Eu só não aprendi ainda a ligar ou desligar isso. Então vive sempre ligado. — Dei de ombros. E eu realmente não sabia como parar de ficar sentindo tudo o que os outros sentia, eu só tinha avançado um pouco a ponto de saber filtrar e amenizar um pouco a intensidade dos sentimentos alheios que vinham para mim. Era como se eu fosse uma antena ambulante e sempre estivesse captando todos eles.  —  Eu te entendo perfeitamente, na realidade. — Abri-lhe um sorriso. Mal conhecia Desirée e já considerava “pacas”.

—  Só para confirmar? Você é irmã dele? —  Por mais que eu mesmo já tivesse negado essa versão anteriormente, vai saber. Eles poderiam ser meio-irmãos ou algo assim. —  Eu não me incômodo se precisarem que eu me ausente, de verdade, Des. — Sorri-lhe amigavelmente. —  Mas se preferir posso continuar aqui e fazer companhia enquanto ele não chega. — Sentei-me na cama de modo mais apresentável e adequado, deixando para trás também toda a parte inicial do susto por ela ter entrado no quarto do nada.

Desirée me fez ficar reflexivo por uns momentos, vagando em minha própria mente em relação a noite anterior. Mas eu só lembro de vê-lo lendo algo, ele estava tão angelical todo quieto lendo que nem falei com ele para que não o atrapalhasse, depois disso só lembro dele ter saído e eu dormi antes mesmo que voltasse.

—  Desculpa, mas eu não tenho certeza. Mas ele costuma acordar cedo, só que eu acordei seis e pouca da manhã e ele não estava mais aqui... — Estalei a língua no céu da boca, perdido sobre o paradeiro de Francesco De Sole, e agora um pouco preocupado. O que me reconfortava era saber que muito provavelmente não havia se metido em briga já que era muito mais fácil as pessoas brigarem por ele do que com ele. Peguei o celular e tentei ligar para ele também, só que não rolou. —  Nada também... — Suspirei pesado. — Mas então, Des. Posso te chamar assim né? Desculpa o meu hábito de apelidar pessoas que mal conheço, foi o mesmo com o Chesco... Tem algo em que possa ajudá-la?! — Espreguicei-me suavemente, tanto tempo deitado havia deixado o meu corpo um pouco molenga.